17 janeiro 2013

Olhos-lua

Continuo a imaginar como seria a nossa vida, juntos.

Na nossa história morríamos velhinhos, sentados num banco-baloiço de madeira, mão-na-mão, olhar no horizonte e um campo de papoilas de perder de vista.

A nossa história teria começado à muitos anos atrás, atrás da memória que é sequer possível de recordar. A nossa história, meu amor, teria começado numa estrela, num céu imenso e infinito, como nós.

Ao sabermo-nos mortais, capazes de morrer, fugíamos para o sitio mais escondido, mais deserto e mais silencioso do mundo, reinventávamos a ideia do amor, e à imagem dele, construíamos a nossa casa, o nosso campo de papoilas.

Se eu pudesse inventar a nossa história, se sequer existisses, terias em vez da pupila, uma lua, sempre cintilante, cheia, transbordante. As tuas mãos seriam sempre quentes, fortes, dedos finos e compridos que ao toque provocassem turbilhões e tempestades dentro de mim.

Continuo a imaginar a nossa vida, juntos.

Se existisses eu sei que nesta infinita planície, mesmo ao longe, eu te reconheceria, ficava a olhar-te enquanto devagar te aproximavas de mim e sim, serias sempre tu ali, com o sol a rasgar raios atrás de ti, os teus pés tapados por papoilas, os teus olhos-lua a falarem comigo sem que a tua boca se movesse.

Mesmo quando disperso e divago acerca do que seria a nossa vida, se existisses, só me permito à imaginação até certo ponto, depois paro. Sei-te não real, não meu, não olhos-lua, nem toque quente. Quando te sinto próximo e me falas dou alguns passos atrás, para te olhar só mais um pouco, e viro costas, para te esquecer só mais um pouco.

Se fosses real, amor meu, nada disto o seria. Nem estas letras, nem os carros frenéticos, nem o ruído ensurdecedor do burburinho das multidões, nem este teclado onde te escrevo. Se fosses real, este mundo seria outro, um mais capaz, mais certo, melhor.

Esta história só seria possível se todo o amor do mundo fosse possível. Se fosse possível, enfim, que o amor fosse tudo o que é possível.

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