20 outubro 2011

Cerebro hiperactivo ou O vazio do pensamento

passam-se as escadas, as entradas dos prédios, os cafés crivados de gente, as salas de cinema a prometerem finais felizes. passam-se as casas, os pinhais, a Dona Maria a vender flores na esquina. passam-se os caracóis a dormir preguiçosamente ao sol, as rosas vermelhas, foge-se das abelhas e dos lagartos, passam-se as estradas e os carros, os jardins.
acena-se ao Sr. Joaquim do talho, à Clarinha a brincar ao pião, ao João e ao Pedro a trocar cromos, ao Carlos da mercearia, à Sra da papelaria de quem nunca soubemos o nome (só o sorriso).
Cai a noite do lado de lá cidade, gosta-se do rio, quieto, quase parado, quase a esquecer que dentro taínhas, latas de sumo, estacas, pacotes de Matutano e preservativos. gosta-se do rio á superficie, julgam-se-lhe peixes coloridos, pedras macias, algas entrelaçadas num jogo de verdes de perder de vista.
caminha-se na margem, pisa-se a calçada [agora uma carica que faz "crsh" e depois uma beata que não faz barulho nenhum], pensa-se pouco, quase nada. Gosta-se do branco tão branco dentro da cabeça, detesta-se o burburinho dos carros e das buzinas.
Na madrugada quer-se um bar cheio de musica e corpos a dançar. Quer-se um fino bem sacado para ajudar à secura. Quer-se a musica alta, muito mais alta, tão mais alta. Quer-se esquecer, embriagar, confundir, julgar que não e logo a seguir que sim. Quer-se a gargalhada lá ao fundo, quer-se descobrir o rosto da gargalhada, quer-se muito, mas ele foge. acaba-se a gargalhada, acaba-se o fino.
acaba-se outro fino e outro que tal, encontra-se a gargalhada caída no chão. come-se a gargalhada e depois disso mais nada, que o cerebro já está cansado de não pensar em nada. que o cerebro está cansado de passar, de fugir, de acenar, de julgar, de querer e de acabar. depois disso fica a gargalhada pendurada nos lábios, a gargalhada roubada, a gargalhada caída no chão.

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